Inauguração do museu

Prédio é o primeiro espaço do Ceará não retirado do local onde foram realizadas as escavações
Unida no alto de um monte, a Comunidade Quilombola da Serra do Evaristo, no Maciço de Baturité, a 90 Km da Capital, sobrevive imersa num verdadeiro mergulho ao passado. A população local coordena uma pesquisa na área que originou o primeiro museu do Ceará não desterritorializado da área onde encontraram material histórico a partir de escavações. O prédio foi aberto ontem, com a presença de Jurema Machado, presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

O Museu Comunitário da Serra do Evaristo é uma pequena sala, feita com detalhes cuidadosos e sofisticados de cerâmica e madeira, com material de urnas funerárias datadas de 700 anos atrás, antes do descobrimento do Brasil FOTO: LUCAS DE MENEZES

O evento foi um verdadeiro acontecimento para a pequena população, formada por cerca de 140 famílias. Uma quarta-feira diferente, com direito a missa, seminário, apresentação artística, discursos e até forró ao fim do encontro para celebrar o que os membros da comunidade se orgulham ao chamar de conquista: a inauguração do Museu Comunitário da Serra do Evaristo.

Em meio a um cenário que possibilita visão panorâmica e privilegiada do Maciço de Baturité, o museu é uma pequena sala, feita com detalhes cuidadosos e sofisticados de cerâmica e madeira, no cume da Serra, e que, por enquanto, abriga material fruto de urnas funerárias datadas de 700 anos atrás, portanto, antes do descobrimento do Brasil.

Agora, o museu abriga o resultado do trabalho de escavações realizadas com o total apoio da comunidade, possibilitando assim a continuação de pesquisas relacionadas a diversos aspectos da época em que as urnas foram achadas, como informações sobre doenças, tipo de alimentação, além de hábitos e vegetação nativa, explica o historiador e arqueólogo, Igor Pedroza, um dos coordenadores das escavações. "Esse sítio nos possibilitou encontrar vestígios com contextos preservados", acrescenta. Hoje, o pesquisador aborda o assunto em seu doutorado.

Expostos no museu, aberto ao público pela primeira vez ontem, estão espécies de potes, machados polidos e outros artefatos de anos entre 1280 e 1390. "Além da pesquisa, das escavações e da recuperação dos artefatos, o estudo resultou na criação do museu, gerido pela comunidade. É uma pesquisa que não se encerra com as escavações, mas tem agora, no museu, uma possibilidade de acompanhamento permanente", diz a presidente do Iphan, Jurema Machado.

Interesse
Já o superintendente do Iphan no Ceará, Ramiro Teles, acrescenta a integração da comunidade com as pesquisas e o real interesse em deixar no local as escavações encontradas. "O material recolhido foi tão expressivo, em tamanha quantidade, que vimos a necessidade da construção do espaço. Foi uma solicitação da comunidade que o material não fosse desterritorializado".

Arqueóloga do Iphan Ceará, Verônica Viana também participou das pesquisas e destaca que, pela primeira vez no Ceará, houve a recuperação de um material da forma como foi abandonado pelos seus autores. "Isso nos possibilita, a partir das escavações, ter resultados diversos sobre esses grupos. Pelo fato de a gente ter esse material preservado, há uma pesquisa bem completa".

Chegar à sede do museu, no entanto, exige paciência. Após a entrada no município de Baturité, são cerca de 20 minutos de carro, em uma estrada feita parte de piçarra e parte de calçamento, praticamente sem nenhuma estrutura urbana para o motorista que faz a subida. Isso porque, diz Ramiro, a ideia da comunidade era não retirar do local de origem o material encontrado. Embora trate a viagem como "um charme" para o visitante, Ramiro admite a possibilidade de tentar viabilizar junto ao poder público melhorias no acesso.

A criação do museu se deu após solicitação da comunidade. O Iphan lançou edital e terceirizou a ArqueoSocio para realizar as escavações com a contribuição da população. A pesquisa teve início em 2012, e os gastos do Iphan com escavações somaram R$ 250 mil. Já o prédio do museu custou R$ 150 mil, mas foi pago por meio de um acordo com uma empresa que havia causado danos em outro sítio arqueológico no País.



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